domingo, 3 de março de 2024

Espetáculo sujo

(Por Omar Chuá)

Amigos, passantes, jornalistas e entrevistadores, curiosos de plantão,
amantes da arte, presenciem pois aqui esse momento inusitado, peculiar, um espetáculo a céu aberto: eis o escultor em sua ocupação, com a mão na massa, criando sua última grande obra, a maior de todas, a tão esperada. Pouco a pouco vai extraindo-a da massa: coxas carnudas voluptuosas, coluna, curvas desejadas, pescoço esticado sem igual, seios eriços, a obra úmida parece transpirar excitação, quando de repente... Oh! Ganha vida! Ganha vida! Escorre pelas mãos em caldo, porém (no mesmo instante) do mesmo jeito misterioso que veio retorna ao encanto de argila e com seus braços estranhos que mais lembram uma boca de fera
engole o nosso escultor misturando-o a grande bola de massa barrenta. O todo é uma só mistura sem distinção. Vejamos pois como se sai o nosso amigo no meio dessa massa. Seus movimentos agora são quase fetais. Sentindo-se desnorteado, diferente, ainda com alguma maestria guiado pela intuição tenta recriar a si próprio, extrair a si mesmo da massa, massa barrenta essa que por sua vez sem nenhuma expressão de dor habilidosamente exata se torna quadrada e imóvel. A chuva com seus incontáveis pingos chega e transforma o quadrado em lama...

Plágios de mesa de bar e outros lugares, Omar Chuá 


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